O Menino-LuaXisbunhirgos
Era uma vez há muitos anos, quando eu ainda era criança e tinha olhos e ouvidos de criança, encontrei certa noite perdido o Menino-Lua! Tinha entrado pela janela do meu quarto, de olhos cinzentos e cabelo cor-de-prata, estava com frio e assustado.
"Quem és tu?" Perguntei-lhe, não menos assustada. "Que fazes aqui? Vai-te embora ou eu chamo o meu pai!" E o menino chorava, baixinho. "Perdi-me! Vou todas as noites tomar banho ao mar, e falar com as minhas amigas estrelas. As estrelas do mar, porque as outras não gostam de mim, dizem-me que não as deixo brilhar, que as apago! Não querem estar perto de mim..." E soluçava "Mas, hoje não encontrei o mar, nem as estrelas minhas amigas, nem os peixes!"
"O mar é aqui perto menino, não tenhas medo!" Disse-lhe. "Eu ensino-te o caminho, se me levares contigo a falar com as estrelas e os peixes! Mas não podemos fazer barulho senão acordamos os meus pais, está bem?"
Limpando as lágrimas de prata o menino respondeu-me "Mas tu és uma criança, filha dos homens! Não falas a língua das estrelas do mar, nem a dos peixes! Não sabes voar nos raios de lua! Não te posso levar comigo, desculpa!"
"Tens razão, não sei nada disso" Respondi. "Mas porque não me ensinas tu todas essas coisas? Em troca ensino-te como chegar ao mar. Conheço bem o caminho, vou lá de dia com os meus pais, e tomamos banho nas ondas e brincamos com a areia da praia!"
"Para que queres saber tudo isso, se amanhã de manhã não te irás lembrar nem de uma palavra? Perderíamos tempo e não te serviria de nada!" E deixando cair tristemente a sua cabeça de prata acrescentou: "Os filhos dos homens tem a memória curta, não dura mais do que umas horas, o Sol fá-los esquecer a luz da Lua e apaga-lhes dos olhos os sonhos que a noite lhes traz!"
"Antes de conhecer as estrelas do mar, costumava visitar uma menina de cabelos dourados, como os teus, e olhos verdes da cor da relva ao Sol! Brincávamos e ríamos muito os dois! Ensinei-a a voar nos raios de luar e jogavamos às escondidas nas nuvens!"
"Vês!" Interrompi. "Afinal sempre podemos brincar os dois como brincávas com essa menina! Vamos, ensina-me a voar nos raios de luar e vamos brincar na praia os dois!"
"Mas... tu não percebes! A menina eras tu! Todas as noites que brincámos: esqueceste-as! Sempre que te vinha ver tinha de ensinar-te tudo novamente! Nunca te lembrávas de mim! Por mais que prometesses que na noite seguinte seria diferente, era sempre igual. Quando eu chegáva assustávas-te, depois vias-me triste e querias ajudar-me! E eu contava-te os segredos da Lua e ensinava-te a apanhar os raios de luar..."
"Oh, desculpa-me!" Respondi, aproximando-me dele. Percebi a tristeza nos seus olhos, chorei também por não me lembrar, por nunca me ter lembrado. "Não fiz de propósito, não tenho culpa de me esquecer... Porque não me ensinas esta noite também? Podíamos brincar como das outras vezes!"
"Hoje não tenho vontade de brincar!" Disse o Menino-Lua. "Sei que não tens culpa, mas sei também que o dia virá em que não só não te lembrarás de mim como não me verás quando entrar no teu quarto! Não ouvirás a minha voz nem poderás aprender a brincar comigo! Não quero cá vir nesse dia, por isso não vou voltar. Prefiro conversar com as estrelas do mar e os peixes, eles não podem voar comigo mas nunca se esquecem de mim."
Soluçando abracei-me ao Menino. "Não quero esquecer-me de ti! És meu amigo! Não quero deixar de ver os teus cabelos de prata e ouvir a tua voz a sussurar no meu ouvido!"
"Eu sei!" Respondeu o Menino-Lua "Mas nada o pode impedir. Não fiques triste, não vais lembrar-te de nada! Não vais sentir saudades minhas! E eu voltarei para o mar e brincarei com as estrelas e os peixes, e um dia virei ver-te quase ao raiar da manhã. Virei ver também outra menina a quem estarás a embalar e que, enquanto dormir nos teus braços, brincará comigo nas núvens e conversaremos os dois com os peixes e as estrelas do mar. Até que um dia ela não consiga mais ver-me e me deixe triste e perdido de novo!"
por Raquel Henriques
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